Google+ O Riso e o Siso: Inteligência e intuição

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Inteligência e intuição


Eu lia o jornal. Ela entrou no quarto. Não percebi.
É que eu lia a coluna do Pasquale, naqueles minutinhos de folga, antes de ir para o trabalho. Ele explicava sobre um caso de crase que, na realidade, era um caso de não-crase e eu estava concentrado para não botar mais a bendita em lugar errado.
-E o seu apelido? Já sabe qual é? Porque eles são assim! Terríveis! Ficam pondo apelido em todo mundo...
Ela estava ali postada ao meu lado, em pé, braços cruzados e imenso orgulho próprio e um misto de indignação... Via-se até coroa de louros em sua cabeça.
-Desculpe! Como é?
Tudo bem que não prestei atenção, não a vi chegar, mas repentinamente ela se pôs a falar do meio, sem prólogo  certamente, pois ela sempre fazia assim. Não entendo muito bem, mas creio que por uma questão de estilística: professora de redação.
-Eu falei com ele, chamei ele de lado e falei assim... porque eu não sou boba não, porque assim...
Aí já me compliquei inteiro, na tentativa de absorver o Pasquale, me impermeabilizava daquela conversa sincopada, as palavras, então, já escorriam pelos olhos e ouvidos.
-Hã? - Sem tirar os olhos do jornal.
-Eu pesco as coisas no ar, não precisa nem falar nada que eu já entendo.
Dancei, vou levar sermão porque não presto atenção no que ela diz, mulheres...
-Não sei, é uma coisa que eu tenho... que eu sou assim...
Droga, minha esposa sempre reclama que não presto atenção, que a deixo falando sozinho, mas eu quero entender essa coluna:
-É? - Apertando os olhos direcionados ao papel, para estancar as palavras que refletiam.
-É, é uma coisa que eu tenho assim, quando estão assistindo o filme, nem vejo e já sei do que se trata...
-Hum... - Ferrou, agora vem a fumada, lá vai. Ela vai querer dormir na casa da mãe dela por isso.
-Pode até tentar disfarçar, mas eu pego... e depressa!
Já era, um mês sem sexo... culpa do Pasquale... ele podia escrever mais diretamente...
-Eu pego assim no ar, quando estão conversando, quando alguma coisa tá acontecendo... eu tenho essa facilidade...
Ótimo, por que será que ela deixou essa qualidade no modo OFF pra falar comigo?
-É, chamei ele de lado e já fui falando: olha, enquanto você tá vindo eu já tô voltando, pensa que eu não sei o que vocês estão fazendo?
Ufa! Ela não ia reclamar de mim! Mas, que droga, que linha eu parei? Por que essa droga de frase não tem crase? Aprendi na escola que tinha...
-E aí ele já falou: desculpa professora, e foi sentar quietinho...
Ele foi? Ele foi, ele vai, quem vai vai a algum lugar, caramba tem crase aí? O que essa mulher ta falando? Será que dei a deixa pra conversa se arrastar?, pensei.
-Então, nem precisei citar o que ele falou, nem falei nada nem nome de ninguém, ele já vestiu a carapuça - agora com ar mais vitorioso, sobre sua inteligência.
-Muito bem meu amor, parabéns, você demonstrou muita perspicácia, deve se orgulhar, colocou ele em seu  devido lugar - como quem dá um biscoito canino, tentando concluir a leitura.
Ela saiu do quarto contente com sua percepção elevada. Ainda bem que ela só a usa em sala de aula...

2 comentários:

  1. Devo deixar bem claro que é fictício! Minha esposa nem é professora! kkk

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  2. Engraçadinho!!! Todos sabemos que é fictício!!!

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