Google+ O Riso e o Siso: Tião, o lacônico

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Tião, o lacônico

O almofadinha se preparando
Repórter de galochas
A equipe de reportagem do Canal de Televisão local se desloca para entrevistar um grupo de moradores chacareiros que reivindicam melhorias para o bairro. O grupo, consituído, em sua maioria, por idosos com baixa escolaridade fazia barricadas na estrada de terra, havia alguns dias, e ameaçava tocar fogo no milharal.
A estrada era praticamente deserta. Uma vez, a dona Rosalinda, 72 anos, passou mal caminhando alguns quilômetros para o próximo ponto de ônibus e foi encontrada só no dia seguinte, sentada num toco, cigarro de palha na mão, conversando com um gambá: o sol cozinhou o cucuruto. O milharal, por sua vez, se limitava a algumas dezenas plantas, destinadas apenas ao consumo local. Mas era o melhor blefe que aqueles velhinhos revolucionários podiam lançar. Ninguém estava disposto a destruir sua horta, nem abater seus animais, que eram muito mais rentáveis na feira.
Acontece que, após dias de levantes e mobilizações senis, no meio do nada. Uma equipe de reportagem da toda-poderosa, interessou-se pelo caso, muito mais a título de curiosidade do que como forma de afetar o prefeito, desafeto da imprensa local.
Ao chegar na região insurreta, com jipe 4x4, estilo Nações Unidas, o repórter desce de galocha na lama dando instruções ao câmera para pegar apenas da cintura para cima, enquanto acerta o gel no cabelo e o pó no rosto.
O grupo rebelde da melhor idade, ao ver aquilo, se agitou: seu Olavo sentiu palpitações, dona Emengarda subiu a pressão e seu Quinzinho atacou a diabetes então achou melhor sair do sol e descansar um pouco na beira da lagoa. Sobrou a palavra para o Tião, reconhecido internacionalmente por sua incapacidade de estabelecer um diálogo prolixo. A economia de palavras era mais que um dom, naquele matuto, era praticamente um transtorno obsessivo-compulsivo.
-Estamos aqui, diretamente do Bairro dos Chacareiros, ao vivo, para cobrir o movimento de reivindicação dos moradores. Como podemos ver, as chuvas das últimas semanas causaram destruição e transtorno para a população local, que resolveu protestar, fazer piquetes e barricadas nesta via rural, além de ameaçarem destruir a produção de alimento. Boa tarde, como é seu nome?
-Tião.
-Muito bem Tião, o que o senhor pode dizer sobre esse movimento de protesto e reivindicação, praticamente composto por idosos, que sofrem com o descaso e o abandono aqui no Bairro dos Chacareiros?
-É um protesto!
-Vocês se sentem abandonados pelo poder público, que favorece regiões com maior densidade demográfica para fins eleitoreiros?
-Não.
-Não? Vocês não lamentam o descaso que a prefeitura tem com vocês por serem idosos, afastados da cidade, e com pouca repercussão eleitoral?
-Não.
-Qual é a reivindicação de vocês então?
-Nóis qué qui mióra essas rua de chão, que põe ônibus mais perto e conserta os estrago da chuva.
-Certo, o acesso ao transporte público, então, faz parte do escopo desse imbróglio?
-Não, não, isso não.
-Bom, mas o senhor não acabou de dizer que reivindicam uma linha de ônibus que passe mais próxima da região?
-Sim, aí sim.
-Tudo bem. Você diria que por causa da idade avançada da maioria dos moradores do bairro, vocês necessitam melhores condições de acesso ao sistema de saúde?
-Não.
-Não? Vocês não têm problemas de saúde?
-Sim, isso sim.
-Ah tá, que tipos de problemas de saúde são mais decorrentes aqui, pela falta de infra-estrutura?
-Não, isso não.
-Quais tipos de doenças vocês costumam ter?
-Bichera, lumbriga, dor nos palto, bico-de-papagaio, pressão alta, diabete, friera, diarréia...
-Certo, e o que acontece quando precisam de atendimento urgente?
-Morre.
-E esses buracos causados pela chuva? Esse aqui tem mais de cinco metros de profundidade...
-Também morre.
-Como é?
-Se cair dentro...
-Certo, mas vocês não têm medo que ele aumente, engula a plantação, os bichos, a casa do senhor?
-Hahaha, mas isso aí não tem perigo, não.
-Não?
-Não, essa porcaria de bairro é tão ruim que ninguém engole, não. Nem buraco!

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